A onda secularizante da cultura moderna, a falência das utopias sustentadas pelas promessas do Iluminismo e a força desagregadora do processo de globalização, balizado por critérios puramente econômicos, voltados para o consumo, geraram um vazio tal, de esperança e de valores, que a missão de evangelizar nos aparece cada vez mais como a urgência das urgências.
Ou, como afirmou Nery: “Já não é mais possível continuar ingenuamente nos restos de cristandade que ainda há entre nós, da fé como social, um costume da família, como parte do fato de ser brasileiro”.
É hora de assumir o novo sujeito social, destinatário da boa-nova: alguém a quem é preciso propor a boa-nova como força para viver, sem rebaixar o que essa Palavra tem de abrupta e desconcertante. Já é tempo de fazer conhecer aos homens e mulheres de nosso tempo “o frescor da boa-nova de Jesus Cristo, para além das sombras e barreiras que a têm desvirtuado”.
3. Uma catequese evangelizadora
Se o destinatário da catequese ainda não conhece a boa-nova de Jesus Cristo e não atentou para a sua força transformadora, tornam-se urgentes algumas tarefas às quais a reflexão catequética não se pode furtar:
a) Aprofundar a necessidade do caráter evangelizador da catequese em tempos de pós-cristandade
Parece tautológico falar de catequese evangelizadora. Toda catequese certamente é evangelizadora, assim como toda evangelização catequiza. Essas duas ações da Igreja estão intrinsecamente unidas e de tal forma entrelaçadas que é difícil distingui-las e defini-las separadamente. Mas há que admitir que, ao longo da história da Igreja, à evangelização foi atribuída a tarefa do primeiro anúncio e à catequese a missão de aprofundar a vivência cristã.
Com o passar do tempo, a prática catequética empenhou-se em dar a conhecer a doutrina católica e ajudar o catequizando a viver nos moldes da ética cristã. Isso pode ser facilmente observado nos manuais catequéticos: quase nada da boa-nova central da fé e muito de mandamentos, sacramentos e doutrina. Foi observando essa realidade que surgiu a expressão “catequese evangelizadora”: um pleonasmo necessário diante da realidade de manutenção da fé que a catequese foi assumindo.
Trata-se, então, de compreender a catequese como evangelização, um desafio posto pela pós-cristandade. Como sugere Alberich, partindo de “um olhar realista e esperançoso, sem nostalgias do passado”, os tempos atuais exigem da catequese uma dimensão evangelizadora, de primeiro anúncio para os que não conhecem ainda o evangelho de Jesus, apesar de já serem batizados.
Eis o primeiro problema: reconhecer que, na estrutura pastoral tradicional da Igreja, a evangelização sempre se apresenta como algo muito secundário — uma tarefa esquecida. Povoa nossa cabeça a compreensão de que a evangelização tem como destinatários os não cristãos, que entre nós seriam bem poucos! A evangelização parece oportuna para terras de missões, o que não seria o caso do Brasil atualmente, com sua maioria absoluta católica.
Acontece, porém, que o fato de os destinatários da catequese serem — quase sempre — pessoas batizadas não garante que elas sejam evangelizadas. Partir desse pressuposto seria falsear uma realidade que se impõe a olhos nus. Não é preciso muito esforço para perceber que se quebrou o espelho da cristandade, onde o sujeito crente se via como tal por incorporação numa cultura cristã.
Reconstituir esse vidro não traz de volta o espelho intacto. O máximo que poderia fazer é apresentar um mosaico com as mesmas peças, mas a imagem refletida é fragmentada, torta, múltipla, sem feições de um autêntico crente: um monstro marcado pela deformação de sua figura genuína.