Por isso, ele começa a atividade pública convidando à conversão, à metanoia, isto é, à mudança de mentalidade: “Convertam-se (metanoeite) e acreditem no Evangelho, porque o Reino de Deus está próximo” (Mc 1,15). Segundo o Novo Testamento, o motivo básico dessa mudança não somos nós, e sim a proximidade do Reino de Deus. É a pertença a esse Reino que determina a conversão como experiência de ressurreição ou vida nova, até a ponto de poder dizer com Paulo:
“Não sou mais eu que vivo, mas Cristo que vive em mim” (Gl 2,20), ou também: “O que sou, devo-o à graça de Deus, e a sua graça não foi vã a meu respeito; pelo contrário, eu trabalhei mais do que eles todos: não eu, mas a graça de Deus que está comigo” (1Cor 15,10).
o valor fundamental que deve sempre estar presente, na prática e na teologia da penitência, é a conversão, como dimensão própria da vida do cristão, já que a Palavra de Deus nos revela todos como pecadores e continuamente necessitados de conversão e de reconciliação. O sacramento da penitência, como toda outra forma eclesial de viver este valor, não teria sentido se não fosse autêntica realização da conversão. Utilizando terminologia tradicional, poder-se-ia dizer que é mais importante a “res sacramenti” (a conversão e a reconciliação do cristão) do que o “sacramentum” (sua celebração eclesial) (RAMOS-REGIDOR, 1989, p. 353).
Da graça da conversão, ninguém é excluído. Na Misercordiae Vultus, o papa Francisco lançou um apelo de conversão até para quem cometeu crimes graves:
Este é o momento favorável para mudar de vida! Este é o tempo de se deixar tocar o coração. Diante do mal cometido, mesmo crime grave, é o momento de ouvir o pranto das pessoas inocentes espoliadas dos bens, da dignidade, dos afetos, da própria vida. Permanecer no caminho do mal é fonte apenas de ilusão e tristeza. A verdadeira vida é outra coisa. Deus não se cansa de estender a mão. […] Basta acolher o convite à conversão e submeter-se à justiça, enquanto a Igreja oferece a misericórdia (MV 19).
Em suma, a conversão tanto de quem cometeu crimes graves quanto de quem cometeu erros leves não fica enclausurada numa dimensão intimista. Manifesta-se numa vida pautada pelo Evangelho, que nos leva a ser “misericordiosos como o Pai” (cf. Lc 6,36), isto é, a sair do próprio egoísmo para assumir a vida do outro e, sobretudo, do outro desvalido.
O sacramento da reconciliação, então, não termina com a absolvição. Continua a ser celebrado ao lado dos últimos e empobrecidos, cuja dignidade foi desfigurada pelo nosso pecado pessoal e social, ou estrutural. Quem se reconcilia com o Pai deve se reconciliar também com os irmãos e irmãs e, sobretudo,
abrir o coração àqueles que vivem nas mais variadas periferias existenciais, que muitas vezes o mundo contemporâneo cria de forma dramática. Quantas situações de precariedade e sofrimento presentes no mundo atual! (MV 15).