O papa emérito Bento XVI morreu aos 95 anos neste sábado (31), anunciou o Vaticano. Ratzinger nasceu em 16 de abril de 1927 na cidade de Marktl, mas passou boa parte da infância e adolescência em Traunstein, perto da fronteira com a Áustria.
De família humilde e o mais novo de três irmãos, entrou para o seminário aos 12 anos e era fluente em diversas línguas, entre elas grego e latim. Mais tarde, fez doutorado em teologia na Universidade de Munique.
Ele foi escolhido papa no dia 19 de abril de 2005, após a morte de João Paulo II, no mesmo ano.
Ortodoxo, Ratzinger era conhecido por transitar entre os conservadores com mais facilidade e um dos favoritos para a sucessão papal, mesmo não sendo oficialmente a sua vontade.
O nome adotado por ele foi o de Bento XVI. Na ata da audiência geral, publicada no site oficial do Vaticano, ele explicou as razões para a escolha.
“Quis chamar-me Bento XVI para me relacionar idealmente com o venerado pontífice Bento XV [Cardeal Giacomo della Chiesa], que guiou a Igreja num período atormentado devido à Primeira Guerra Mundial”, disse ele.
“Ele foi um profeta corajoso e autêntico de paz, e comprometeu-se com coragem infatigável primeiro para evitar o drama da guerra e depois para limitar as consequências nefastas”, completou.
São Bento também é o padroeiro da Europa e fundador da Ordem Beneditina.
Bento XVI, no entanto, também viria a ser o primeiro papa a renunciar em 600 anos, após a Igreja Católica se tornar alvo de escândalos envolvendo acusações de corrupção e pedofilia.
Trajetória na Igreja Católica
Devido ao seu conhecimento acadêmico e científico, o futuro papa contribuía de forma significativa para a Igreja Católica.
Em 1977, foi nomeado arcebispo de Munique e Freising e a sua sagração episcopal foi oficializada no ano seguinte. Tornou-se o primeiro padre diocesano a assumir a arquidiocese da Baviera.
No mesmo ano foi nomeado cardeal e participou de conclaves que elegeram João Paulo I e João Paulo II.
Este último o ordenou prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé – o antigo Tribunal da Inquisição, que ficou conhecido historicamente por perseguir e punir quem se desviava das condutas impostas pela Igreja.
Em 1982, Ratzinger renunciou ao governo pastoral da arquidiocese de Munique.
Em 1998, com a nomeação para vice-decano do Colégio Cardinalício, Ratzinger ficou ainda mais próximo do cargo de chefe de Estado do Vaticano.
Com o nome aprovado pelo Papa João Paulo II, sua eleição para decano foi aceita em 2002.
Eleição
Com a morte de João Paulo II em 2 de abril de 2005, o Colégio de Cardeais articulou para iniciar as discussões para a escolha do novo papa.
Com 1.115 cardeais, as quatro votações foram realizadas, mas apenas no fim do dia de 19 de abril a chaminé do Vaticano soltou uma fumaça branca, anunciando assim a escolha de um novo pontífice.
Ratzinger foi anunciado como novo papa e decidiu ser chamado de Bento XVI. O nome foi oficialmente anunciado em 24 de abril de 2005, em uma missa especial realizada na Praça de São Pedro, no Vaticano.
Bento XVI discursou a favor de uma liderança que abraçava a todos.
“Nas suas pegadas [de Bento 15], desejo colocar o meu ministério a serviço da reconciliação e da harmonia entre os homens e os povos, profundamente convencido de que o grande bem da paz é antes de tudo dom de Deus – dom frágil e precioso que deve ser invocado, tutelado e construído dia após dia com o contributo de todos”, acrescentou durante a audiência.
Mesmo assim, suas alternativas apresentadas em discurso não foram suficientes para o pontífice se ver fora de polêmicas.
Por defender uma Igreja conservadora e fazer afirmações contrárias à adoção de crianças por pessoas do mesmo sexo, foi criticado por parte da imprensa.
Temas como aborto, pedofilia e homossexualidade também foram alvo de discussão.
Em documento registrado no site do Vaticano, o antigo papa chegou a impor restrições aos sacerdotes em seminários.
“A Igreja não pode admitir no Seminário e nas Ordens Sacras aqueles que praticam a homossexualidade, apresentam profundas tendências homossexuais ou apoiam a chamada cultura gay”, comunicou.
Algumas declarações foram dadas durante a sua primeira viagem à América Latina, visitando o Brasil, em maio de 2007.
Ele veio para 5ª Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho, no Santuário de Aparecida, em São Paulo, para a canonização de Frei Galvão, que tornou-se Santo Antônio de Sant’Anna Galvão.
Em sua passagem pelo país, fez duras críticas à imprensa por considerar que ela não valoriza o casamento e “faz pouco” pela virgindade dos solteiros.
Também criticou o aborto, a pesquisa com embriões e eutanásia, e chegou a negar que a Igreja tenha batizado à força os índigenas do continente americano.
Além disso, fez um apelo para que os governos apoiem as mulheres que optam por ficar em casa para cuidar da família.
Bento XVI também foi alvo de críticas quanto a casos de pedofilia envolvendo sacerdotes espalhados pelo mundo.
Acusado de omissão, o papa emérito teve que demitir diversos bispos e promoveu uma “limpeza” depois de um dos escândalos mais emblemáticos ser revelado.
O caso envolvia um padre mexicano que faleceu em 2008. O sacerdote Marcial Maciel abusou sexualmente de diversos seminaristas e teve filhos com inúmeras mulheres.
No final de seu pontificado, os escândalos aumentaram. Em 2012, foi a vez de documentos confidenciais da Igreja serem vazados para a mídia italiana, evidenciando a falta de transparência e acobertando casos de lavagem de dinheiro.
Cartas do próprio pontífice sobre temas sensíveis, como escândalos sexuais e intrigas internas, também foram expostas.
O caso foi batizado pela imprensa italiana de Vatileaks. O mordomo Paolo Gabriele, que trabalhava com o papa desde 2006, foi preso por ter sido responsável pelo vazamento dos documentos até então secretos para o jornalista investigativo Gianluigi Nuzzi.
Gabriele foi julgado no final de 2012 e condenado pelo Tribunal do Vaticano a 18 meses de prisão. Bento XVI o perdoou tempos depois.
Na época, as investigações apontaram que Gabriele não agiu sozinho. Ele teve ajuda de Claudio Sciarpelletti, técnico em informática que trabalhava para a Secretaria de Estado do governo central da Santa Sé, no Vaticano, e tinha acesso às informações.
Riscos
Bento XVI também foi alvo de tentativas de agressão durante o período de governança. Um deles ocorreu em 2007, quando um homem ultrapassou o bloqueio de segurança da Praça de São Pedro e tentou entrar no veículo que transportava o papa entre os fiéis.
Ele foi contido imediatamente e o imobilizaram.
Uma mulher, Susanna Maiolo, também atentou contra Bento XVI duas vezes, em 2007 e 2008.
Na primeira ocasião, ela ultrapassou a segurança, mas foi detida antes. Já na segunda oportunidade, Maiolo chegou a puxar o papa, que caiu durante a Missa do Galo.
Ele não se feriu e continuou a celebração instantes após o atentado.
Na confusão, o cardeal francês Roger Etchegaray sofreu uma queda e quebrou o fêmur, precisando passar por cirurgia. Maiolo foi encaminhada a um hospital e internada para tratamento psiquiátrico.
A renúncia ao papado
Em fevereiro de 2013, aos 85 anos, Bento XVI renunciou ao cargo. Em anúncio feito durante uma reunião com os cardeais, ele revelou o real estado de sua saúde.
“Após ter repetidamente examinado minha consciência perante Deus, eu tive certeza de que minhas forças, devido à avançada idade, não são mais apropriadas para o adequado exercício do ministério de Pedro.”
Com a renúncia formalizada no dia 28 de fevereiro de 2013, Bento XVI deixou oficialmente suas responsabilidades como o maior representante da Igreja Católica.
Ele foi substituído pelo argentino Jorge Mario Bergoglio, intitulado Francisco, em 13 de março de 2013.