O próprio Rei e Senhor de todos, tanto quanto cobiçou a tua beleza, deseja agora a tua resposta afirmativa, porque por ela decidiu salvar o mundo. Agradaste a ele pelo silêncio, muito mais lhe agradarás pela palavra … Se tu lhe fizeres ouvir a tua voz, ele te fará ver a nossa salvação”.
Este trecho não só é retoricamente bonito, mas também nos ensina como Deus respeitou a liberdade de Maria. Não lhe impôs a maternidade divina. Predestinou-a, mas lhe pediu o consentimento. Elegeu-a desde antes da criação do mundo, ornou-a com todas as bênçãos e graças, mas aguardou seu sim, sua disponibilidade.
O sim de Maria veio acompanhado de uma declaração de humildade: “Sou a serva do Senhor” (Lc 1,38). Volto a citar São Bernardo: “Que sublime humildade é esta que não soube ceder às honras e não sabe orgulhar-se na gloria! É escolhida para ser a Mãe de Deus e se proclama a serva.
É certamente sinal de grande humildade não se esquecer de ser humilde quando é oferecida tamanha glória. Não é grande coisa mostrar-se humilde quando se é desprezado; ao contrário, é virtude insigne e rara ser humilde quando se é honrado”.
Com o sim de Maria, o Filho de Deus assumiu a carne humana; “subsistindo na condição de Deus, não se apegou à sua igualdade com Deus, … tornou-se solidário com os seres humanos e apresentou-se como simples homem” (Fl 2,6-7). A paternidade de Deus une-se para sempre à maternidade da jovem Maria de Nazaré.
O “faça-se” de Deus ao criar o universo soma-se ao “faça-se” de Maria para recriar, em seu Filho, todas as coisas na face da terra. Em Jesus Cristo, Messias e Salvador, não se separam mais a paternidade de Deus, que fecundou Maria mediante o Espírito Santo, e a maternidade de Maria, que acreditou no convite.
O “faça-se” de Maria encerra o tempo da espera; as criaturas, tendo à frente o Filho de Deus concebido no seio virginal de uma mulher, entram na “plenitude dos tempos” (Gl 4,4): “pelo ingresso do eterno no tempo, do divino no humano, o próprio tempo foi redimido e, tendo sido preenchido pelo mistério de Cristo, se torna definitivamente tempo de salvação” (Redemptoris Mater, 1). Maria tornou-se assim, como diz o Prefácio da festa da Imaculada, o início, as primícias da Igreja.
Estamos diante de vários mistérios unidos, que perfazem o grande e inaudito mistério da salvação. É estupendo, mas verdadeiro. É inédito e acima de qualquer inteligência humana, mas é obra, graça e vontade de Deus e, como afirmou o anjo na hora da Anunciação, “para Deus, nada é impossível” (Lc 1,37).
Embevecido diante do mistério da maternidade divina de Maria, São Boaventura (+1274), compôs um longo hino de louvor à maneira do Te Deum. Destaco alguns versos: ”Os coros dos anjos, com vozes incessantes, te proclamam: santa, santa, santa, ó Maria, Mãe de Deus, mãe e virgem ao mesmo tempo! Os céus e a terra estão cheios da majestade vitoriosa do Fruto do teu ventre!
O glorioso coro dos apóstolos te aclama Mãe do Criador! Celebram-te todos os profetas, porque deste à luz o próprio Deus! A imensa assembleia dos santos mártires te glorifica como Mãe do Cristo. A multidão triunfante dos confessores prostra-se diante de ti, porque és o Templo da Trindade!”.