Em 2009, o Brasil celebra o centenário do nascimento de Dom Helder Pessoa Câmara, arcebispo emérito de Olinda e Recife, aquele que talvez tenha sido a voz brasileira mais conhecida no exterior. Junto com Dom Paulo Evaristo Arns, Dom Helder, por conta de sua inspiração e coragem, foi uma das personalidades mais temidas pela ditadura.
Tal como se estivessem diante de um apóstolo ou de um Santo Antonio, as pessoas paravam, largavam o que estavam fazendo para ouvi-lo falar. Eu estava em Portugal, quando escutei que Dom Helder ia dar uma palestra em um Seminário, que estava perto da casa onde eu morava.
No dia da palestra, notei que o guarda abandonou o controle do trânsito da esquina e entrou timidamente no salão do Seminário Maior de Oporto para escutar o pregador.
O Prelado era homem corajoso e objetivo. É dele uma frase lapidar: “Se ajudo os pobres, me chamam de profeta; se pergunto por que existe a pobreza me tacham de comunista.” Certa vez, eu viajava de João Pessoa para São Paulo. O avião fez escala no Recife, onde Dom Helder embarcou.
Os passageiros se levantaram e aplaudiram aquele homem idoso e sorridente, em sua característica batina cinza. Dom Helder foi um injustiçado na vida e na morte. Enquanto o piloto Ayrton Senna e o cantor Leandro tiveram pompas fúnebres de celebridades, ele teve um funeral modesto, digno de um homem humilde.
Por sua coragem profética capaz de denunciar as injustiças sem medo foi perseguido. Foi chamado pelos corifeus da ditadura de “arcebispo vermelho´´.
Em 1972 esteve cotado para receber o Prêmio Nobel da Paz. Os generais, pessoas altamente “esclarecidas´´, mexeram os pauzinhos para que ele não recebesse o prêmio. Teria sido o único Nobel autorgado, até hoje, a um brasileiro. Certa vez, ligou para um empresário, pedindo um emprego para um irmão seu. Dias depois, o homem de negócio dá o retorno:
Tudo certo, Dom Helder, o rapaz já está trabalhando. Só que não precisava dizer que ele era seu irmão. O Senhor é Câmara e ele é Silva. Além disso, o Senhor é branco e ele negro!´´. Como o bispo insistia na tese da irmandade, o dono da firma observou: Pode ser seu irmão por parte de Adão e Eva, mas não é seu irmão de sangue!.
A resposta do velho arcebispo foi memorável: “Mas, como, não? Ele é meu irmão, é irmão de sangue, sim! È o generoso sangue de nosso Senhor Jesus Cristo, derramado na cruz, que nos fez irmãos de sangue de todos!´´.
Apontar caminhos não dá Ibope. Por causa do filtro ideológico, imposto à Mídia da época, a maioria dos atos de Dom Helder nunca teve ampla divulgação nacional. Dessa forma, apenas uma parcela da sociedade soube quem ele era e o que ele fez pelos pobres e oprimidos. De onde tirava tamanha força espiritual para enfrentar com sorriso nos lábios persecuções, incompreensões e marginalização?
Dom Helder, desde os primeiros anos de Seminário, se levantava às duas horas da madrugada para se entregar à mais profunda oração. Deste encontro com Deus ele recebia a força de ser compassivo e solidário com a humana desventura. Com sua morte, aos 90 anos, em 1999, perdemos um grande cristão, um discípulo de Cristo de gigantesca dimensão, mas, ganhamos um intercessor poderoso junto a Deus. Esperamos que sua santidade seja um dia reconhecida oficialmente pela Igreja.
Padre Ernesto.
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Paróquia São José – Santo Antonio Descoberto – GO